
David L. Allen analisa
criticamente a suposta proposta apresentada por Michael Haykin de que os pais
da igreja defendiam uma Expiação Limitada. Tendo feito essa considerações vamos ao texto de David L. Allen.
Uma Análise do livro de Michael Haykin, "Nós
Confiamos no Sangue da Salvação": Expiação Limitada na Igreja Primitiva" (57-74)
Traduzido por Josimar Rodrigues.
Michael Haykin contribui com um
capítulo sobre a expiação limitada na igreja primitiva. Embora talvez Haykin
seja conhecido mais como um erudito da história Baptista, ele escreveu uma
dissertação sobre a controvérsia Pneumatológica no quarto século. Historicamente, o ponto
inicial de partida para examinar a questão da extensão da expiação seria o
período da patrística.
Antes de lançar uma discussão
sobre os sete principais pais da igreja, Haykin apontou que a questão da
extensão da expiação não era controversa na igreja primitiva. Então "o que
pode ser extraído desta doutrina daquela época são principalmente comentários
implícitos e não afirmações direta".[20]
Este é um ponto importante,
porque na verdade não há nenhuma afirmação aberta sobre expiação por qualquer
pai da igreja, embora existam várias declarações claras sobre a preocupação com
a expiação universal. Haykin examinou os seguintes sete principais pais da
igreja: Clemente de Roma, Justino Mártir, Hilário de Poitiers, Ambrósio,
Jerônimo, e brevemente Agostinho e Próspero de Aquitânia.[21]
Clemente de Roma.
Haykin aceitou o "resumo
contextual" de Gill que "os eleitos de Deus" com "nós"
em 1 Clemente 49:5 sendo "inteiramente justificável."[22]
Mas isso não é prova de que Clemente tenha defendido uma expiação limitada no
sentido de que Cristo morreu apenas pelos pecados dos eleitos. Na verdade,
Haykin até mesmo nos apontou 1 Clemente 7:4, onde ele diz que o sangue de
Cristo "disponibilizado conquistou a graça do arrependimento ao mundo
inteiro". Isso parece ser uma declaração clara afirmando uma expiação
universal através de Cristo para o mundo. Haykin concluiu sua breve análise de
Clemente, observando que as passagens examinadas "fornecem vislumbres
de perspectivas soteriológicas, uma das quais parece estar claramente de acordo
com as ênfases do NT que a morte de Cristo foi para os eleito."[23] Isso está muito
longe de afirmar que o próprio Clemente defendeu uma expiação limitada.
Justino Mártir.
Aqui Haykin elencou talvez uma
dúzia de declarações de Justino, que fala especificamente sobre a questão da
extensão da expiação. Haykin concluiu que "todas estas referências
implicam especificidade na extensão da expiação". Duas coisas devem ser
observadas: (1) Haykin "sugere"
e "afirma" que Justino Mártir não ensinou abertamente e nem
definiu uma expiação, (2) na realidade, contextualmente todas essas referências
demonstram e implicam especificidade com respeito à expiação para aqueles que
Crer, não uma expiação limitada de pecados para os eleitos somente. Haykin
então apontou com razão para um texto-chave que indica que Cristo morreu pelos
pecados de todos: Cristo sofreu "no lugar da raça humana."[24]
Mas Haykin concluiu que esses textos de Justino "não fornecem uma
declaração clara sobre a extensão da expiação" A tentativa de sobrepor a
afirmação clara de Justino sobre uma expiação universal com suas outras
afirmações e concluir então que "elas
podem muito bem ser interpretadas como afirmando uma particularidade na
extensão da expiação"[25]
equivale a uma súplica apelativa. Há peculiaridades na aplicação da
expiação como todos os pais da igreja afirmam. Mas não há nenhuma declaração limitando a expiação em sua extensão
exclusivamente para os eleitos.
Hilário de Poitiers.
Haykin citou Hilário em Sl. 129:9,
incluindo a declaração de que Cristo "veio para remover os pecados do mundo."[26] Notando que
Hilário frequentemente usou o plural da primeira pessoa em relação à expiação
em seu comentário sobre os Salmos, Haykin concluiu que "o conceito de redenção particular não está
fora do alcance do pensamento de Hilário."[27] Mas isso não leva
em conta que quando qualquer autor, bíblico ou não, fala da expiação no
contexto de dirigir-se a crentes ou com referência a crentes, o uso de plurais
em primeira pessoa seria inevitável e de modo algum servirá para indicar que o
autor estava falando apenas dessas pessoas. Assumir tal postura seria invocar a
falácia de inferência negativa. Que a morte de Cristo "tem um significado
especial para os crentes"[28]
não é negada por ninguém, mas certamente não implica uma expiação limitada.
Ambrósio.
Aqui Haykin observou que "uma análise atenta das declarações de
Ambrósio sobre a cruz revela as sementes de certas explicações textuais ... que
mais tarde seriam empregadas na defesa da expiação limitada no final do século XVI e XVII."[29]
Mas, novamente, esta não é nenhuma prova de que Ambrósio defendeu a expiação
limitada. Haykin, dependente da tradução originalmente do Latim feita por Gill
e Gill's, onde afirmam que Ambrósio empregou o duplo argumento do risco que
John Owen usou para sustentar seu caso para a expiação limitada. Mas
contextualmente, duas coisas se tornam evidentes.
Em primeiro lugar, está claro que
Ambrósio afirmou a expiação universal na seguinte citação que precede
imediatamente a citação feita por haykin:
A Escritura disse também, de uma maneira maravilhosa:
"Ele o entregou por todos nós", mostrando que Deus ama a todos que
entregou o seu filho amado por cada um. Para os homens, portanto, Ele deu o dom
[salvação] que está acima de todos os dons; Seria possível que Ele não tenha oferecido a todos esse dom?[30]
Aqui, a dependência de Haykin em
relação a Gill nesse ponto é problemático. Nada em Ambrósio levaria a concluir
que ele afirmava uma expiação limitada.
Em segundo lugar, Ambrósio não estava
usando o argumento do duplo risco (uma pessoa sendo punida duas vezes pelo
mesmo crime) como Owen usou. Como Shedd observou com razão, o duplo risco como
Owen tentou usá-lo é inadmissível porque nenhuma pessoa está sendo punida duas
vezes.[31]
Na seção que Haykin citou de Ambrósio, Ambrósio deixou claro que ele estava se
dirigindo aos crentes (observe a segunda pessoa "você"). Ele já
declarou que Cristo morreu pelos pecados de todos os homens. Agora ele está
endereçando os benefícios dessa salvação para aqueles que creem. Ambrósio está
justamente distinguindo entre a extensão da expiação e a aplicação da expiação,
o que Owen e Haykin não fazem. O significado para Ambrósio é que os crentes não
podem mais ser responsabilizados pelo castigo futuro.
Jerônimo.
Haykin citou o Comentário de
Jerônimo sobre Mateus (3,20) com referência a Mateus 20:28. Ele admite que há ambiguidade
na declaração de Jerônimo, mas disse que as palavras "insinuam que Jesus viu a morte de Cristo
para um grupo particular de pessoas - crentes."[32]
Novamente, aqui as questões são se Jerônimo tem em mente a intenção, extensão
ou aplicação da expiação. Nada nesta citação afirma a expiação limitada nem
impede a expiação universal. "Sugerem que Jesus viu a morte de Cristo como
sendo para um grupo particular de pessoas - crentes".
Agostinho.
Haykin nunca disse que Agostinho
ensinou uma expiação limitada, mas afirmou que alguns de seus comentários
"sugerem."[33]
Apelou às declarações de Agostinho sobre João 10:26; 14:2; e 1 João 2:2. Muitos
calvinistas que defendem uma expiação ilimitada interpretam 1 João 2:2 se referindo
apenas à igreja.[34] Além
disso, Haykin não observou o fato de que é claro que Agostinho pensou que Jesus
expiou os pecados de Judas![35]
Não usarei o espaço aqui para
relatar as diversas vezes que Agostinho afirmou a expiação ilimitada através do
uso de frases tais como Cristo morreu "pelos pecados de todo o
mundo", a morte de Cristo é o "resgate do mundo inteiro" e como
Cristo "pagou o preço pelo mundo inteiro". Olhe "Agostinho"
acima. Em sua Exposição sobre o Livro dos Salmos, Agostinho falou do
"mundo" em relação à expiação de tal maneira que exclui qualquer
possibilidade de significado diferente para cada pessoa do mundo.[36]
Haykin apelou para a opinião de Raymond
Blacketer sobre Agostinho. Curiosamente, Blacketer corretamente observou que
"não há nenhuma declaração única do bispo de Hipona que explicitamente declara
que a intenção de Deus no sacrifício de Cristo era obter redenção apenas para
os eleitos ". Mas ele, então, incorretamente concluiu que essa era "precisamente a visão que Agostinho tinha."[37]
Blacketer, e talvez Haykin,
confundiu as declarações de Agostinho sobre a vontade predestinadora de Deus
para os eleitos com sua visão sobre a satisfação real por todo o pecado, o que
Cristo realizou na expiação.
Próspero.
Haykin também erroneamente
interpretou Próspero primeiro dando "fortes sugestões de uma expiação
limitada em Agostinho."[38]
Ele citou Próspero como dizendo que Cristo morreu "por todos", mas
também notou que Próspero disse "que Ele foi crucificado apenas por aqueles
que se beneficiam com sua morte."[39]
Haykin não conseguiu discernir em que sentido Próspero fez essas declarações. Em
resposta à objeção de que Cristo "não sofreu pela salvação e redenção de
todos os homens", Próspero afirmou claramente a morte de Cristo pelos
pecados de todos, mas também afirmou que somente aqueles que creem se
beneficiarão da obra salvadora de Cristo: "Uma vez que nosso Senhor tomou
sob si mesmo a única natureza e condição que é comum a todos os homens, é
correto dizer que todos foram redimidos e que, no entanto, nem todos são
realmente retirados da escravidão do pecado."[40]
Haykin observou ainda que Próspero,
posteriormente em sua carreira , "parece ter suavizado esse compromisso
com a expiação limitada, ou mesmo o tenha a rejeitado em favor de uma defesa da
vontade salvífica universal de Deus com base em sua leitura de 1 Timóteo 2:4."[41] Mas mesmo em seu
período anterior, o chamado alto agostiniano, Próspero manteve a mesma exegese
de 1 Tim 2:4 que ele em sua alegada fase de partida fez mais tarde.
Não há nenhuma evidência de sua
interpretação de 1 Tim 2:4 na Chamado dos Gentios que Próspero partiu de uma
suposta posição anterior da expiação limitada. Tudo isso é um desvio de
Próspero e pode ser visto quando se lê cuidadosamente as seções pertinentes da
sua defesa de St. Agostinho.[42]
É evidente que Próspero afirmava a expiação ilimitada e nunca a expiação limitada.
Em conclusão, Haykin deve ser
elogiado pelo fato dele não afirmar que nenhum desses autores que ele pesquisou
afirme claramente a expiação limitada. Mas ele deve ser criticado por várias
questões. Primeiro, o capítulo é apenas uma breve pesquisa de sete pais da
igreja. Em segundo lugar, Haykin perdeu significativa evidência contrafactual
que mostra claramente alguns desses homens afirmando uma justificação ilimitada
de pecados e, portanto, não afirmam uma expiação limitada. Jerônimo é um
exemplo. Ele não trabalhou todos os escritos existentes dos seus escolhidos
pais da igreja com o objetivo de se envolver em uma pesquisa
analítica/sintética. Reconheço que ele não pode cobrir todo o campo; Ninguém
poderia. No entanto, é preciso ter mais base do que se reflete neste capítulo.
Terceiro, ele parece depender fortemente de fontes secundárias (Gill e
Blacketer) e não consegue interagir com outras fontes secundárias
significativas. São problemas metodológicos sérios.
O capítulo de Haykin passa a
sensação de estar apressado e muito dependente de fontes secundárias. Esta não
é certamente a norma para a escrita de Haykin. Eu aprecio sua meticulosidade
cuidadosa e usual. Mas neste caso, seu capítulo não é um guia confiável sobre
este assunto.
[20] M. Haykin, "'We Trust in the Saving
Blood': Definite Atonement in the Ancient Church," in From Heaven He
Came and Sought Her, 60.
[21] Veja o capítulo um da primeira parte desta
obra.
[22] M. Haykin, "'We Trust in the Saving
Blood': Definite Atonement in the Ancient Church," 61.
[23] Ibid., 62.
[24] Ibid., 64. Justin Martyr, "Dialogue with
Trypho. a Jew," The Apostolic Fathers, Justin Martyr, Irenaeus, in Ante-Nicene
Fathers, 10 vols., ed. A. Roberts and J. Donaldson, rev. By A. C. Coxe
(1885; repr. Peabody, MA: Hendrickson, 2004), 1:247.
[25] Ibid., 65.
[26] Ibid., 67.
[27] Ibid., 68.
[28] Ibid.
[29] Ibid., 70.
[30] Ambrose, "Jacob and the Happy Life,"
in Seven Exegetical Works. Fathers of the Church 65, trans. M. P. McHugh
(Washington: Catholic University of
America Press, 1970), 135-36.
[31] W. G. T. Shedd, Dogmatic Theology
(Nashville, TN: Thomas Nelson, 1980), 2:443.
[32] M. Haykin, "'We Trust in the Saving
Blood': Definite Atonement in the Ancient," 70.
[33] Ibid., 71.
[34] For Examples, see my chapter "The
Atonement: Limited or Universal?," in Whosoever Will: A
Biblical-Theological Critique of five-Point Calvinism, ed. D. L. Allen and
S. Lemke (Nashville: B&H Academic, 2010), 61-107.
[35] See Augustine's "Exposition of Psalm
LXIX," Section 27, in NPNF, eds. P. Schaff and H. Wace (1892; repr
Peabody, Ma: Hendrickson, 2004), 8:309.
[36] Augustine,
"Exposition of Psalm XCVI," in NPNF, 8:472. For evidence that
Augustine clearly held to universal atonement, see the section on Augustine
above.
[37]
R. Blacketer, "Definite Atonement in
Historical Perspective," in The Glory of the Atonement Biblical,
Historical and Practical Perspectives,
ed. C. Hill and F. James III (Downers Grove, IL: InterVarsity, 2004), 308.
[38]
M. Haykin, "'We Trust in the
Saving Blood': Definite Atonement in the Ancient," 72.
[39] Ibid.,
72.
[40]
Prosper,
"Prosper of Aquitaine: Defense of St. Augustine," trans. and
annotated P. De Letter, S. J., in Ancient Christian Writers, 66 vols. (New
York: Newman, 1963), 32:164.